quinta-feira, 15 de outubro de 2009

"Pavane pour une infante défunte"

          Há dores que se amoldam tão perfeitamente a nossa psicosfera, por mais neguemos sua existência, que, por todos os nossos poros psíquicos agem como nosso "cartão de visita". Normalmente, são abafadas, ruminadas em silêncio na tentativa de destruí-las e, quanto mais as calcamos mais recalcadas ficam.
          Não sei se a forma materializar-se-ia, mas a angústia do "vir a ser" murchar ante as mãos impotentes e o pensamento confrangido é suficiente para fazer crer que sim - oh, látego cruento!
          O que pode o homem ante a sutileza das Leis que agem na mórula, na blástula e na gástrula consoante o campo "psicomagnético" que ali se forma, conduzindo e orientando o desenvolvimento?
          Fica a alegria triste do que poderia ter sido no amadurecimento da galvanização dos centros emocionais. Fica também a esperança de novo pequeno ser a buscar nossa fonte nutriz - do alimento físico ou do espiritual...
          Há aqui melancolia, reconheço. No entanto, é um ato terapêutico e expressa vontade firme de nova oportunidade, seja como for. Quando a flor é amada, não nos interessa em que vaso foi plantada.
          Saúdo, assim, a todos os rebentos, na figura daquela que ainda não veio.
                   

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Coisas Insignificantes

          Nem sempre há assunto sério sobre o que escrever, e estou certo de que nessa ocasião pode-se aquilatar o desvario de uma pessoa. Eu poderia discorrer sobre o acúmulo de debris celulares no humor vítreo de meus olhos, as moscas volantes, ou simplesmente moscas, que me acompanham desde a infância, sendo motivo de distração, às vezes. Às vezes, porque o se concentrar nelas por muito tempo pode desencadear uma crise de ansiedade e até de certa angústia, uma vez que elas nunca desaparecerão. O grande segredo para mim foi descobrir que, mexendo os olhos ou mesmo a cabeça, os "monstrinhos" deslocam-se, já que nadam em verdadeira geleia; ao menos, é permitido vê-los em pontos diferentes. O difícil é pensar "não os verei"! Estarei condenado à sua companhia enquanto neles pensar. Nessas horas, sempre imagino o drama de quem padece de cisticercose ocular... Reconheço que é pura neurose e que posso ser taxado de vagabundo por não ter mais nada a fazer.
          Outra coisinha triste é pensar no Infinito, assim grafado como entidade independente. Lembro-me das aulas de Matemática ouvindo as primeiras professoras explicando que os números são infinitos à direita do zero e, mais tarde, também o eram à esquerda do zero. Pior, descobri que entre dois números, naturais ou não, há infinitas possibilidades! Ainda me vejo, nas noites insones, construindo espirais com os números sem encontrar o fim para a árdua viagem. Pelo menos, é ocorrência noturna e, de qualquer forma, se eu contasse carneirinhos, imediatamente viria à mente o fato de que posso passar a noite contando-os, sem fim. Quando paro para pensar na infinitude da vida então, tenho a sensação de que minha mente é um grande polvo que carece de coordenação motora e abraça-se continuamente, esmagando-se sem atingir sua meta. Acabo de ter um insight de que talvez seja mais do que neurose...
          Uma façanha de que descobri ser possuidor é a de ver, espontânea ou deliberadamente, rostos humanos em qualquer superfície para onde dirija meu olhar. É sempre mais fácil quando o fenômeno é espontâneo. Sou acompanhado por tal "dádiva" desde muito pequeno, o que posso fazer? Grande negócio é não pensar que é uma mensagem do Além. Não é! A saída é olhar para os pequenos e por vezes decompostos rostos, imaginando-os por exemplo como esboços e ensaios de grandes pintores e escultores, ou simplesmente como - acharam que eu diria loucura? - desarmonia com o pensar dominante.
          Poderia - como vocês também - contar inúmeros fatos semelhantes, somente para descobrir que, embora haja indivíduos a quem a Vida dotou de inúmeras responsabilidades, a da grande maioria, de que faço parte, tem a sua repleta de coisas insignificantes mas que lhe emolduram o ser e fazem de cada um universo particular.
          Por hoje basta!     

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Apresentação / Introdução

O nome deste Blog surgiu há aproximadamente dez anos e nem era para ser nome de blog. A ideia era escrever um livro... Como talvez ele nem surja, não quis desperdiçar seu batismo, afinal. É provável que eu seja somente um "escritor de títulos", e já ficaria muito satisfeito se houvesse emprego para tal pessoa. O fato é que, na aparente contradição do nome está a pujança do pensamento que lhe deu causa. Poderá um espantalho utilizar um guante? É o que pretendo demonstrar aqui (com a frequência possível) para que se perca o preconceito e para que as ideias, os pensamentos e as máximas, alheias ou minhas, bailem à vontade forçando a reflexão, esta útil. De que valerá um conceito - físico, metafísico, filosófico, religioso ou psicológico - se não houver reflexão? Melhor seria acompanhar o frenesi das formigas em plantação nova e tenra.
Para não estragar esta apresentação - introdução e por mais tola pareça a imagem que tomo à memória, penso que espantalhos sempre remetem a plantações (e, não sei por que para mim, são sempre milharais ou trigais). Pois bem, moro em apartamento, com todos os seus bons e maus caracteres, e para fugir um pouco à clausura da vida moderna e metropolitana, tenho uma pequena jardineira, meu pequeno ecossistema, em que faço "experiências", ou melhor, adiciono alguns agentes e os deixo desdobrarem-se e mostrarem sua potencialidade. Há pouco mais de um mês, minha esposa e eu jogamos lá alguns grãos de milho de pipoca que estavam "habitados" por entidades ainda desconhecidas. Sempre ouvi que os grãos de milho de pipoca recebem tratamento tal que não germinam... De fato, em minhas poucas experiências infantis, não vi nascer um talo sequer. Para este espantalho foi maravilhosa a surpresa (eu não acompanho, sinceramente, os avanços na produção de milho de pipoca) do nascimento de pequenos pés de milho, na verdade, pequenos bonsais - ? - com algumas flores. Sei que não passarão disto, mas a alegria de vê-los trouxe-me, mais uma vez, o espanto de admirar as forças naturais e, assim, a vida.
Não há efeito sem causa e, ainda que assumamos erroneamente que a causa é o milimétrico / centimétrico milharal, eis toma corpo o mesmo espantalho adormecido a defender os pés de milho das agruras humanas.