quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Bissoneto

          Meu pai é poeta. Mais, gosta do assunto e o estuda, tendo publicado alguns ensaios inclusive. Normalmente, escreve sonetos e trovas. Transcrevo, de seu "Major Vade-Mecum Poematicum" a explicação para bissoneto, criação sua. Por sinal, deixaram sua marca os Sonetos e Bissonetos de VÔO (com acento, pois são as iniciais de seu nome: Varlô Ôlo de Oliveira):
"[...] Criei-o na década de 60, no Rio, mas só o publiquei, num ensaio sobre Poesia, em 1968, em Curitiba. Vinte e dois versos. De 4-4-3-3, passei para 4-4-3-3-4-4 (ou de 8-6, para 8-6-8, forma estrófica melhor). Para evitar dificuldades rimáticas, admite-se o esquema ababcdcd, efgefg e hihijkjk [...]"

          Estou longe de ser poeta, mas, como tive ocasião de dizer antes, aqui mesmo, às vezes escrevo em versos. Daí, noite insone, veio a "herética" ideia de tentar um bissoneto... Como não devo nada a escola alguma nem pretendo alcançar lugar algum com isso, ei-lo (usei o esquema rimático abbaabba cdecde abbaabba):


Bissoneto da Incapacidade de Amar

Sentir arder a chama indefinível,
Querer ousar a sanha dos amantes –
Arpejos de mil cordas dissonantes –
Morrer no coração indisponível...
Tornar a questionar-se se é possível,
Com tantos sentimentos suplicantes,
Pesando dividendos e montantes,
Amar portando a paz incognoscível...

Intenso nessa busca por tolices
O peito ri e sangra e estertora
Gozando a antevisão do paraíso...
E parte, tolo, afeito às estultices
Do pérfido sentir que se assenhora
Do desgraçado que perdeu o siso!...

Oh, dor da carne d’alma putrescível!
Discórdias vivas entre os querelantes
Recordam corpos a dançar, arfantes,
Sem ter, no entanto, a perfeição tangível
Da idolatria pétrea e invencível
Que outrora ornava os corações cantantes...
Motivos estes, tais, desconcertantes,
Que fazem esse amor tão desprezível!